segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Passeio às serras do Socorro e da Archeira

7 de Setembro, 9 horas — Encontro no Largo da Cadriceira. Algumas palavras do Sr. vice-presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Carlos Bernardes. Ciência no Verão — Iniciativa conjunta da Universidade de Évora e da Câmara Municipal de Torres Vedras. A condução do passeio foi da responsabilidade de Carlos Cupeto, da Universidade de Évora. Prestou apoio José L. Diniz, também geólogo, amigo e colega de curso de Carlos Cupeto.
A poucas centenas de metros, na estrada que leva a Casal de Barbas, paramos para visitar o tronco fóssil; está soterrado, para preservação. Ali à volta, facilmente se encontra pequenos pedaços soltos ou semienterrados…, pedaços de madeira é o que parecem. Limpamos a terra, pegamos na madeira e vemos que se tornou pedra. Têm a dureza e as qualidades físicas próprias da pedra. Milagre? A evolução de milhões de anos…

A 4km,7 Catefica (4 km. ao S. a Cadriceira, onde se pode admirar um exemplar notável de flora fóssil, tendo na parte descoberta do tronco cerca de 11 m. de compr. e 1m,6 de diâmetro na região menos grossa, excedendo, pois, as dimensões do tronco fóssil que se vê no Kensington Museum, cujo diâmetro não passa de 1 m.) — 7km,6  entr. com uma estr. à dir., para S. Pedro da Cadeira, pela Ventosa; […]
In Guia de Portugal II, Biblioteca Nacional de Lisboa, 1927, p. 555; EXCURSÕES DE TORRES VEDRAS, 3. A Mafra. — Duas estradas: a) por Turcifal e Gradil (25km,5).

Sobre o tronco fóssil de araucária, descoberto em 1908, ver aqui.

Nesta paragem se falou na natureza, que aqui nos rodeia à solta e ainda mais quando começarmos a embrenhar-nos na serra. Carlos Cupeto falou na perspectiva de insustentabilidade do sistema actual, num futuro relativamente próximo, havendo já muitas centenas de milhões de pessoas, em todo o mundo, a passar fome. Não há alimentos suficientes para tanta gente. Em poucas décadas, seremos dez mil milhões. O número escreve-se, assim:
10 000 000 000

Há produtos químicos utilizados na agricultura, que permitem obter maior produção, mas com efeitos secundários negativos. E corremos o risco de ficar sem frutos, sem fruta, com o perigo de extinção das abelhas, que é real. Pode ser o fim da humanidade. Morrem as abelhas e morremos nós. As abelhas e outros insectos são agentes polinizadores, fazendo uma cobertura integral de todo o globo terrestre. Podemos não pensar nisso ou ver só o nosso cantinho, mas é assim. Isto, mais ou menos, diz Carlos Cupeto. Não lembro se referiu o livro, recentemente saído, precisamente com o título 10 000 000 000. Creio que sim1. Ouvi tudo com muita atenção, havendo lido algum tempo antes no Público uma notícia sobre o perigo de extinção das abelhas.

«Quatro anos depois de se extinguirem as abelhas, extingue-se a humanidade.» (Afirmação atribuída a Albert Einstein.)

Voltamos à estrada, avançamos e um pouco mais à frente, à esquerda, tomamos o caminho da serra. Subir custa quase nada, mas com a continuação… É preciso não irmos ficando para trás, por qualquer razão, que depois é acelerar para apanhar o grupo e o cansaço duplica. Pára-se aqui e ali, tira-se fotografias. Uma saibreira desactivada é cenário para explicações sobre a formação de camadas, estratos. Entre duas camadas mais ou menos semelhantes, há uma tira mais clara, estreita, comprimida como se se tratasse de argamassa. Falou-se em arenito, uma areia consolidada pelo peso de milhões de anos. Esta saibreira, criada pela necessidade da indústria humana, de alguma modificação controlada ir praticando no meio, acabou por ser agradável; pela lição que proporciona, e pela criação de uma espécie de anfiteatro de zona húmida, com tabuas e outra vegetação. Há que anos, um ror de anos que não via tabuas em todo o seu esplendor, terminando naquela ponta de foguete, castanha aveludada.
Biodiversidade, educação ambiental.
E vamos subindo. Passam por nós dois motards. Sobem. Também talvez desçam. E dois ciclistas, em bicicleta todo o terreno. Impressionou-me muito conseguirem fazer toda a subida até ao cimo da serra do Socorro. Diz alguém que as bicicletas são muito leves, de carbono, e com mudanças, muita rotação à roda pedaleira e pouca progressão. Não sei. Não pareceu tão lento. Já lá vem um a descer…, e depressa. Temo pela segurança dele.
Nova paragem em observatório de aves. Há dois.
No alto. Temos companhia. Muitos motards, em momento de convívio e descanso. Da esplanada fronteira à igreja e dependências, apreciamos a paisagem a toda a volta. Aqui fazem fronteira três concelhos: Sobral, Mafra e Torres Vedras. Os compartimentos ao lado da igreja albergam painéis historiando as Linhas de Torres. O templo não é grande, mas não consigo dizer que é pequeno, porque na sua dimensão sentimo-nos à vontade, como se fosse grande. Tem lá a sua grandeza, a sua riqueza espiritual. Sentimo-nos leves no alto das montanhas. A igreja é graciosa.

Descemos pela outra encosta da serra, em direcção ao vale, à passagem por debaixo da auto-estrada. A certo passo, à esquerda, uma fonte que tem água todo o ano. Da bica nada corria, mas de fora, surde do chão, por baixo do coberto vegetal, uma nascente. Humildemente, vai para a calçada, sem se dar por ela, mas inunda e desce por ali abaixo, não se sabe onde finda.
Passamos o túnel e cada qual come do que trouxe (pode-se partilhar). Fomos frugais. Sentámo-nos encostados a uma parede de edifício de quinta, Quinta de A da Guerra. Em frente de nós o Monte Deixo.
Prosseguimos. Aos lados do caminho, um ou outro sobreiro. Lá no alto, dois moinhos já sem cabeço. E, aqui na história é como um sopro, temos o Furadouro à vista. Entramos na sede da associação para um café, estar um pouco, uns com os outros e com as pessoas que ali estão. Em frente da sede não há casas, mas nesta zona, no meio da paisagem, um campo de futebol com relva sintética.
Estamos no Largo da aldeia, um pouco mais concentrada; não muito, porque se expande pelas várias encostas e insinuações preexistentes do terreno.


Vamos encontrar na Archeira: arenitos, margas e calcários. Em relação à Serra do Socorro, é diferente a constituição do terreno,  não favorável a determinados cobertos florestais2.
Ao longo da subida fomos fazendo e levados a fazer várias observações. Onde estamos já foi fundo de mar. No chão da estrada de campo, apanhamos, literalmente, bivalves. Há pedras cheias de conchas incrustadas ou muitas conchas amalgamadas que se foram petrificando. Na berma, cortada para se fazer o caminho, abundam conchas. Pareceria que os povos que nos precederam, ali deixaram concheiros, depois de terem aproveitado as conchas para a sua alimentação. Não foi o caso.
Uma subida ainda para vencer..., já me vou sentindo cansado. Alguém disse, na outra serra (a do Socorro), que, quando se sobe, é melhor não olhar para cima, para o que falta subir. Se formos subindo, passo a passo, damos connosco no ponto mais alto. Olhar para baixo, dá vertigem. Olhar para cima, pesa, tira ânimo e fadiga. Mais à frente, novo lance de subida. Já não falta muito, mas depois do que já andámos..., e cansa olhar.
Vemos pedras, flores, conversamos... Há uma pedra branca, na berma declivosa, cheia de cristais, uma borboleta, uma formiga preta na mesma pedra branca, carregando uma «palha» seca.
Estamos no planalto, diante de parque eólico. Do lado mais alto (o marco geodésico  está no seu recinto), um cartaz assinala a presença de uma fortificação da primeira linha do sistema defensivo das Linhas de Torres: a obra n.º 128 -- Forte da Archeira (ou Cheira) ou Furadouro.
Daqui tomámos o caminho directamente na direcção da Cadriceira, descendo, descendo, parando, escorregando num ponto mais inclinado, passando outro túnel por baixo da A 8, até ligar as pontas do círculo no mesmo largo de onde havíamos partido. Estava tecida a visita. Cada um volta para as suas casas, o meu transporte já ali estava, requisitado pelo telemóvel, e dos outros companheiros caminhantes, ninguém se perdeu. Todos ficámos, com certeza, a fazer planos para uma próxima. Por mim, penso em mais dois ou três dias, como este.
__________________
1 Vi, depois, o que escreveu sobre este assunto.
2 Ainda na Serra do Socorro, o nosso guia contou uma história, cuja transposição, por poder ser infiel, é da minha responsabilidade: alguém – pessoa ou empresa — quis plantar eucaliptos na serra da Archeira, para replicar a plantação de eucaliptos da serra fronteira do Socorro. Foram comprados terrenos, mas o negócio não correu bem, pois a constituição dos solos não é apropriada.
*
Nota: Como não me foi possível fotografar mais, voltei ao Furadouro, dias depois, em 12 de Setembro, uma sexta-feira de manhã. Tudo foi mais fácil. Não houve cansaços, físico nem psicológico. As fotografias desta segunda etapa, aqui ficam, separadas das do dia 7 por um asterisco.


Encontro no Largo da Juventude, Cadriceira
45 inscritos; algumas palavras do Sr. vice-presidente da C, M, de Torres Vedras sobre o que ali nos trouxe, tendo à sua esquerda o orientador do passeio de estudo, da Universidade de Évora.

Logo à saída do Largo, uma latada, que o morador da casa fez gosto em nos mostrar, percebendo certamente o muito gosto que teríamos em a ver. 

Não se percebe na fotografia, mas os cachos estavam muito bem criados,  com bagos bem grados.

Junto à araucária fóssil, que não se deixou ver.

No mesmo lugar, pedaço de madeira-pedra, ou seja, madeira fossilizada. Apenas a desenterrámos; estava à flor da terra.

Pequenos fragmentos de madeira fossilizada, no mesmo lugar


A Cadriceira fica para trás, mas ainda está perto

A bananeira tem direito a estar presente, por ser excepção, nestes sítios


A saibreira

Estratos, camadas. Um livro aberto, para quem o sabe ler.

No mesmo lugar, as tabuas, com as suas belas «pontas aveludadas».

 Primeiro observatório de vida selvagem (11:10)

 O mesmo

 O mesmo

 O mesmo

O segundo observatório (11:34)

O mesmo

No alto da Serra do Socorro. À esquerda, o fotógrafo da expedição, José L. Diniz, e também orientador de algumas destas sessões de estudo e divulgação.


Reunião de lambretas e motos


O alto da serra é estrema de três concelhos (de memória; a confirmar)






Primeiro, houve uma ermida (primeira metade do século XVI). Em meados do século XVIII, intervenção na capela-mor: retábulo de talha dourada, paredes com azulejos e imagens encomendadas aos escultores do Palácio de Mafra. Ver webgrafia.

Rainha das Virgens / Ora por nós / Ano do Senhor / 1820











Vista do alto

O mesmo

O mesmo

O mesmo

O mesmo

Começa a descida




A Serra de Montejunto, no horizonte




De novo, a Serra de Montejunto. Estas fotografias são sequenciais

A bica não está a deitar água, mas ela corre todo o ano, do chão, junto à fonte, ao lado esquerdo de quem olha para a fotografia.


A água surde, quase clandestina, por entre as pedras e as ervas

É um pequeno regato, forçando o seu caminho

Primeiro túnel



Estes dois moinhos vêem-se do lado de cá, da Quinta de A de Guerra e vamos vê-los do Furadouro e da Serra da Archeira

Quinta de A de Guerra

Sobreiro, junto à Quinta de A de Guerra

Aqui, o musgo encontrou alguma condição especial para fixar residência. Afloramentos rochosos semelhantes, muito próximos deste não tiveram este revestimento


Aqui comemos do que levávamos e ainda sobrou

Vamos deixando o Socorro para trás


Os mesmos moinhos de há pouco, quase omnipresentes

Sobreiros


Aula prática. Na queda, as rochas maiores deslocam-se mais rapidamente para baixo. Refiro-me à formação de rochas sedimentares. Esta minha maneira de falar é como traduzir em calão o que disse o guia em português de lei e pode não estar correcta. Inspiro-me em Eça, que disse em Últimas Páginas, artigo «Francesismo»: «Portugal é um país traduzido do francês em calão.»



Descemos, com Furadouro à vista

A «sede» (ACRD) é a primeira casa, à esquerda



Igreja do Furadouro

***









































As duas serras, às vezes conversam. Aqui, o Socorro, visto da Archeira, já perto do cimo
As fotografias são sequenciais, no espaço e no tempo





Material fóssil apanhado no caminho (primeira e segunda visita)














No planalto

Marco geodésico, no recinto do forte da Archeira

Painel informativo sobre o Forte da Archeira


Um fosso, construído para a defesa do forte

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Regresso ao Furadouro (12 Set.)
No final, enquanto aguardava pelo transporte, tive o prazer de conversar casualmente com o dinamizador do Rancho Folclórico e Etnográfico Danças e Cantares do Furadouro, que também faz parte do rancho da Mugideira. Trocámos, assim, impressões sobre a tarde de folclore na Feira do Mato do Turcifal, já aqui noticiada, e sobre o papel, em geral, destes agrupamentos, de forte interesse cultural e identitário.
No Furadouro, existe outro rancho, com sede na associação em que entrámos no dia sete do corrente mês.




Enquanto esperávamos, num dos abrigos da paragem dos autocarros, olhávamos para o edifício, actualmente sede do Rancho Folclórico e Etnográfico Danças e Cantares do Furadouro, com o seu amável dinamizador, homem ainda com idade de ter muito para dar.
*
Pequena webgrafia complementar
http://www.cm-tvedras.pt/agenda/detalhes/6293/ — Informação sobre o evento
Geologia, território e floresta - Serra do Socorro.
Pode, ainda, ver-se, por curiosidade, sobre o Ecoparque da Serra da Archeira:

4 comentários:

  1. Que passeio interessante...!!!
    Foi uma aula prática, daquelas...!!!
    Apesar do cansaço físico, acredito que deve ter sido muito gartificante....
    O texto e as fotos não podiam ser mais elucidativos..
    Parabéns...
    Albertina Granja

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    1. No domingo, haverá outro passeio: "Caminhos da Boavista». Concentração às 9:30 nos Casais da Boavista - Delgada - Bombarral. Piquenique no «Casal da Tia São». Posso ir a este e já estou inscrito. Vai ser muito gratificante, com certeza.
      Boa semana!


      JL

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  2. Obrigado pela sua visita....Eu também o estou seguindo....
    Um abraço

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