terça-feira, 11 de junho de 2013

Távola Redonda
Folhas de Poesia
As vinhetas das capas
Tem a sua graça comparar as vinhetas das capas da Távola Redonda. Mas, antes de mais, alguma coisa sobre esta revista. Criada e dirigida por David Mourão-Ferreira, António Manuel Couto Viana e… — o melhor é apresentar a ficha técnica, na página 2 do fascículo 1 —,
no pós-guerra, pretendia «um lugar para a poesia». A seguir a 45, parecia só haver lugar para uma poesia mais empenhada, interventiva, menos intimista. A fidelidade ao encontro perante as coisas, a vida, o mistério inicial, depois desenvolvido com equilíbrio pelo poeta, é o que propõem no primeiro fascículo ou folha Alberto de Lacerda e David Mourão-Ferreira (o Davífen, das crónicas de Artur Portela Filho, no Jornal Novo). Temos uma conjugação de pessoas com qualidades diversas. No fascículo 11, em artigo não assinado, (D. M.-Ferreira) sugere-se a união de todas as publicações de poesia numa só, o que não veio a conseguir-se.
«TÁVOLA REDONDA» OU DA (IM)POSSÍVEL HARMONIA
                          (Título do texto introdutório à edição fac-similada da T. R.,de João Bigotte Chorão)
Perguntar-se-á: as épocas não são outras, as preocupações diferentes? Sem dúvida, a poesia neste Janeiro de 1950 é com certeza diferente da poesia de 1930 ou 1940. Mas para explicitar essa mudança, para revelar é este um dos papéis da crítica) uma provável modificação nos processos e nos temas não é preciso negar a autonomia da arte, da poesia. Esse o grande erro, esse o nosso protesto. O seu lugar é único, insubstituível, in-comparável, embora em relação com a vida inteira. Cada poeta arrasta consigo, como um facto se encadeia noutros factos, todo um universo.     (Alberto de Lacerda, «Um lugar para a poesia», na p. 2, fascículo 1]
Lirismo, desenvolvimento de uma exclamação: atitude de quem se espanta, se admira ou repara — perante, ou em uma — qualquer circunstância, e tende logo a isolá-la, torná-la independente e memorável. É uma atitude feita de momentos que se tornam excepcionais; mas tal excepcionalidade, como é involuntária, não deve transformar-se, para o Poeta, nem em motivo de opróbrio nem de orgulho; muito simplesmente, urge não esquecê-la, na discussão do fenómeno lírico. Outro aspecto, necessário também de se tomar em linha de conta, é o da referida involuntariedade em que o momento se torna excepcional, exigindo um ulterior desenvolvimento. O que caracteriza o lirismo não é, portanto, a natureza do momento ou da circunstância, a natureza da emoção ou do motivo. O que o caracteriza é o aspecto involuntário, em que momentos, circunstâncias, emoções e motivos se apresentam ao Poeta, o aspecto de excepcionais que eles adquirem e, de maneira decisiva, o processo como eles ulteriormente se desenvolvem.     (David Mourão-Ferreira, «Lirismo – ou haverá outro caminho?», na p. 8, fascículo 1)

Em Janeiro de 1950, quando apareceu o primeiro fascículo de Távola Redonda, não existia em Portugal nenhuma publicação de Poesia. […] Pouco a pouco, começaram, depois, a surgir novas folhas de Poesia […]. De qualquer modo, para o público de poesia com que podemos contar, são elas excessivas – e o certo é que a existência de quase todas é tão precária que emudecem (extinguindo-se? Interrompendo-se?) ao fim de dois ou três números. Por isso, daqui lançamos o alvitre de um Encontro […]. E[…] talvez que desse Encontro viesse a surgir uma Revista de Poesia Portuguesa. – uma Revista única, onde cada grupo dos já existentes e dos que viessem a formar-se disporia de um número certo de páginas – para lá publicar o que muito bem entendesse.     («Sugestão», pp. 8 e 6, fascículo 11, não assinado, de D. M.-Ferreira)

 As vinhetas





















*

As primeiras cinco vinhetas têm uma forma de quase quadrado, ocupando apenas metade da largura da página.
A cor das vinhetas é igual à das restantes ilustrações e do texto impresso.
Fascículo 1 — Uma sereia, de negro, deitada de lado, com a frente para nós. A cabeça está no lado esquerdo, mancha negra, de perfil. Entre o braço esquerdo arqueado e a cabeça há um espaço em branco que faz a figura de uma lua (quarto crescente). O braço descansa a mão sobre a cabeça e o ombro, do nosso lado. Sobre o côncavo da anca, uma estrela do mar. No canto superior esquerdo, o que parece ser um cavalo marinho. A cauda sobe, a pino, espadanante. Termina em U, parece um caldeiro fumegante, com línguas de fumo aos bordos. Uma estrela no rosto, outra no braço. Barbatanas. Ao lado direito, na vertical: António Vaz Pereira [escrita invertida e de cima para baixo]. Cor: Preto.
Fascículo 2 — A mesma figura, a negro, a cabeça para o lado direito; agora, o braço direito rodeia a cabeça. A assinatura, desta vez, está da maneira habitual, escrita de baixo para cima. No canto superior direito, um búzio.
Fascículo 3 — Igual à do fascículo 2, em castanho.
Fascículo 4 — Igual à anterior, em azul.
Fascículo 5 — Igual à do fascículo 3, em castanho menos escuro.

Fascículo 6 — Esta vinheta, e as seguintes até à última, ocupa toda a largura da página. O lado esquerdo é preenchido pelo título. O lado direito é ocupado por um gentil centauro, de belas melenas, a cauda, uma segunda cabeleira. Dum lado e doutro da cabeça do centauro, em plano superior, um sol flamejante com escuro em fundo (à esquerda) e a lua (quarto minguante), escura. Os traços expressivos à volta do centauro indicam energia, movimento; o rosto do centauro é sereno. A sereia passou a mulher deitada na terra, tronco semierguido, apoiado no cotovelo esquerdo. Vemos os dois braços e olha-nos de frente; cabeleira um pouco levada pelo vento e encorpada, como denunciando alguma expectativa. Duas flores junto aos pés da mulher. O centauro, ainda mal acabou de assentar as patas no chão. No canto inferior direito, a assinatura: A

Fascículo 7 — Igual à do fascículo 6, cor castanha.
            Fascículo 8 — Igual à do fascículo anterior, cor azul.
        Fascículo 9 — Igual à do fascículo anterior, cor roxa.
        Fascículo 10 — Igual à do fascículo anterior, cor verde.
        Fascículo 11 — O espaço central é preenchido pelo título. A um dos lados, a mulher, cabelo ao vento, puxado para trás, e do outro, o homem, ela à esquerda e ele à direita. O cabelo dele, mais curto, também é puxado para trás, embora as direcções sejam opostas. Ela tem o braço esquerdo no ar, a mão quase aberta, em jeito coloquial ou de quem sopra um beijo da concha da mão; olha para ele, parecendo ter acabado de dizer qualquer coisa. Ele, também novo e adulto, não tem barba. São figuras de hoje, de aspecto algo leve e despreocupado. Ela tem flores junto de si, à frente e ao lado, réplicas do sol das vinhetas dos fascículos 6 a 10. Ele tem-nas atrás de si, duas estão no ar, todas são uns sóis escuros ,malmequeres solares, núcleo de sol e pétalas de chamas absorvidas em fundo escuro. Às espaldas dela parece haver uma lua (quarto minguante) escura; cabeça e pescoço são emoldurados por uma janela sem portadas. Ela, em semiobscuridade; ele, todo em claridade. Atento e ponderado. Uma ave desce em voo picado junto à face dele. Na mão direita, segura uma flauta de sete tubos de cana de tamanho desigual, ligados por uma atadura; tem dois cornichos, um dos quais mal se vê.

Ela é uma bela mulher. Ele é Pã.
Cor: castanho.

Assinatura: esta vinheta e as seguintes deixam de ser assinadas.

Fascículo 12 — Igual à do fascículo anterior, cor: azul.

Fascículo 13 — Igual à do fascículo anterior, cor: roxo.

Fascículo 14 — Igual à do fascículo anterior, cor: verde.

Fascículo 15 — Igual à do fascículo anterior, cor: castanho.

Fascículos 16 e 17 — O esquema é semelhante ao das vinhetas a partir do número 6; ao meio, o título da revista; a mulher desapareceu, no lado esquerdo um cavalo a erguer-se nas partes dianteiras; do lado direito, o homem, sentado em grande pedra, o corpo estirado, tronco em linha com a perna esquerda estendida, rosto virado para o cavalo. O braço esquerdo estendido segura o cajado em que de algum modo se apoia. Diálogo de iguais ou de cavaleiro a cavalo, de mestre a aluno, a parte superior de si a dominar a inferior, o seu ser desdobrado, o centauro a cindir-se em dois. A lua, sobre o braço esquerdo (quarto minguante). Vegetação rasteira, ervas e fetos à volta do homem, jovem e com tanga.

Cor: azul.
Fascículo 18 — Igual à dos fascículos 16 e 17. Cor: castanho.
Fascículos 19 e 20 — Igual à do fascículo anterior. Cor: verde.
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Desenhos e ilustrações
As vinhetas devem ser todas de António Vaz Pereira. Os desenhos e ilustrações são de António Manuel Couto Viana (13-15-16/17-19/20), António Ramos (14), António Vaz Pereira (1-2-3-4-5-6-7-8-9-10-11-12-13-14-15-16/17-18-19/20), João Matoso (12), João Santiago (13-16/17), José Régio (8), Júlio (10).
De António Vaz Pereira, o director artístico, diz Goulart Nogueira, no último n.º da revista, fascículos 19 e 20, em artigo intitulado «A Poesia da Távola»:
Em António Vaz Pereira, quase irrompe a iluminação vulcânica, a imagem barroca que poderíamos ver a circular subterraneamente em vários poetas da «Távola»; mas uma ciência madura adoça e contém a avalanche da natureza.      (Pág. 15, col. 3, 2.ª metade)
Edição:
Távola Redonda, prefácio de João Bigote Chorão; ed. Fac-similada do original de 1950/54, Lisboa, Contexto, 1989.
Bibliografia:
A inserta no fim do artigo de João Bigotte Chorão que serve de prefácio à edição citada: «Távola Redonda» ou da (Im)possível Harmonia.
Não deixamos, no entanto, de fazer menção especial, apesar de também figurar na bibliografia de João Bigotte Chorão, ao Boletim Cultural (do Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian, VI Série — N.º 11 — Outubro de 1988, dedicado a
                                                                      AS FOLHAS DE POESIA 
     TÁVOLA REDONDA
com orientação de David Mourão-Ferreira; introdução e escolha de textos de António Manuel Couto Viana. Pode ser consultado em pdf, neste endereço:
http://www.leitura.gulbenkian.pt/boletim_cultural/files/VI_11.pdf

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