quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Thomas Mann

A Morte em Veneza



     Acabei, ontem, de ler A Morte em Veneza, de Thomas Mann. Um escritor a começar a envelhecer, sóbrio, de prestígio seguro, num impulso de fuga, tentação inesperada de «uma errância vadia pelo mundo», resolve deixar o palco habitual do seu trabalho e vai à procura de um verão «suportável e proveitoso», «três ou quatro semanas numa estância balnear da moda no Sul amável...».
     Vê em Veneza, no hotel em que estava hospedado, um jovem polaco. O rapaz, um pouco esguio, pálido, nos caracóis dos cabelos, na maneira de andar, na maior liberdade e menos rígida disciplina que a imposta pela mãe às irmãs, no domínio formal dos pormenores, no olhar, causou a impressão de uma figura da mitologia, de uma divindade a «Gustav Aschenbach ou von Aschenbach, como passara oficialmente a chamar-se desde que fizera cinquenta anos». Inicia-se, assim, um dia-a-dia de seguimento, de aproximação mais ou menos furtiva, desde a sala de jantar do hotel, até à praia do Lido e pelas ruas da cidade dos doges.
     O artista, criador que é, busca a perfeição da forma; no esforço de precisão e disciplina, faz surgir do caos a beleza e nisso aproxima-se de um deus ou de Deus. Ou da Natureza. Aschenbach compara o seu trabalho no campo da linguagem, com o da natureza: «A disciplina, a precisão do pensamento que a perfeição daquele corpo juvenil e muito direito expressava! A vontade rigorosa e depurada que, trabalhando no escuro, consegue trazer à luz esta imagem divina -- não a conhecia ele, o artista, não lhe era familiar?» Com considerações sobre o inteligível e o sensível, o amor do belo, a partir das coisas sensíveis, somos introduzidos no universo de Platão e lembra-nos o Banquete. A leitura leva-nos a outro diálogo de Platão e assistimos na página 71, a Sócrates/Aschenbach  ensinando a Fedro o desejo e a virtude, o belo -- caminho do homem sensível para o espírito. Página e meia de prosa acabara de ser escrita.


***

     Morte em Veneza é o título de um filme de Luchino Visconti, 1971, baseado na obra homónima de Thomas Mann. Podemos ouvir aí o adagietto da 5.ª Sinfonia de Gustav Mahler, compositor em quem Visconti se terá inspirado para compor a personagem Gustav Aschenbach.
     Merece leitura o artigo de Pedro Mexia «Os Três Tadzios», publicado no suplemento Actual, do Expresso de 13Ao2011 e, incluído no livro O Mundo dos Vivos, do mesmo autor, Lisboa, Tinta da China, MMXII, p. 29 e segs.



             

                   ***


A Morte em Veneza é hoje tema de debate, em mais uma QUINTAS COM LIVROS, agora mesmo, na Biblioteca Municipal de Torres Vedras. Vou já para lá.

Sem comentários:

Enviar um comentário